sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

O PODER É NEGRO (com trocadilho, por favor)

Hanka Nogueira


Brown - Reservei-me o direito de escrever sobre a eleição do Obama depois da poeira assentar. Obama-mania a parte, em meio a tantos textos uma coisa me chamou a atenção: O foco demasiadamente simplista dos artigos e das matérias ditas jornalísticas, onde a questão da cor da pele do presidente é colocada sobre todas as outras. A impressão passada foi que a questão black/white norte-americana foi suplantada para o mundo. O próprio Obama preferiu correr as léguas do perrengue, (Jessé Jackson já tinha provado do gosto amargo da questão quando pré-candidato democrata em 1984 e 1988) Ele mesmo, o Obama, Se disse mulato. Sim, mulato. Claro que a palavra usada não foi essa e sim marrom, ele lembrou a todos ser filho de uma branca com um negro, e por desconhecimento do termo mulato ficou com o brown mesmo.

A primeira vez em que ouvir falar em Obama foi durante as eleições de 2000, na época o vice-presidente norte americano Al Gore, era o então candidato dos democratas para concorrer a vaga na Casa Branca. Durante a campanha de Gore em Seattle o então senador de IIIinois subiu ao palco em meio ao frisson encabeçado por afro militantes de peso: Spike Lee, Oprah Winfrey e Jesse Jackson, na ocasião um jornalista entrevistou Spike Lee que afirmou: Ele vai ser o futuro presidente dos Estados Unidos. Fora a empolgação dos afro militantes, o que me chamou a atenção foi a figura do Barack Obama. A figura esguia era sedutora, elegante e mesmo que eu não entenda nada em inglês, reparei que tinha uma retórica que empolgava a platéia em sua maioria composta por brancos. A imagem ficou guardada.

Bufa republicana - Muito se escreve sobre a eleição do presidente, mas, a maioria não foca o que realmente importa nesse momento de crise mundial encabeçada pelo Tio Sam. O exercício do poder. E se tratando de presidente norte americano esse deveria ser o maior foco e preocupação. Não há como negar que do ponto de vista simbólico a eleição de Obama é de uma força sem precedente, mas, também não podemos esquecer da sua necessidade de “salvar” a economia do país e de manter a sua colocação de mandante no mundo, principalmente depois da passagem desastrosa da bucha ou bufa republicana, como preferir, pela Casa Branca nos últimos oito anos.

Há quem diga que a eleição de obama é fruto das Políticas de Ações Afirmativas implementada nos Estados Unidos desde a década de 60. Extremamente exagerada essa afirmação. Mesmo após 40 anos de ações afirmativas existem mais afro-estadunidenses nas penitenciarias que nas universidades. A própria historia do Obama descarta essa idéia. Ele me parece mais um “imigrante legal” (filho de uma americana branca com um queniano, nascido no estado do Havaí, morando na islâmica Indonésia até os 10 anos, voltando aos 11 para os Estados Unidos, criado numa família branca classe media), que um afro estadunidense típico como a sua mulher. Essa sim, militante e fruto das ações afirmativas norte-americanas.

Bling-bling - Quanto ao poder dos afro-estadunidenses 12,8 % da população, portanto, a menor minoria entre as minorias, exercem uma maior influencia cultural que política, principalmente fora do país. Afinal, a cultura mundial pop é fruto da arte negra norte-americana. Essa influencia vem desde o jazz, blue, rock, passando pelo fenômeno Michael Jackson (esse com Triler transformou o pensamento de Andy Warhol em realidade: a cultura pop em um produto real, consumista, descartável, global). Até o movimento hip hop, que já se perdeu faz tempo, afinal de contas, o estilo bling-bling (possuir carrões, diamantes, iates, jatinhos, mulheres, tudo no plural mesmo), faz parte do american way or life das estrelas de rap e seus seguidores pelo mundo. Exibir faustosamente suas jóias, usar notas de cem dólares para acender charutos Cohiba, enquanto atiram as de menor valor na cara das mulheres, como se as mesmas fossem pedaços de carne, demonstra definitivamente, que o protesto do gueto virou um produto do capitalismo predatório norte americano.

O cara tem sorte - Ainda que a sua história e até o seu nome não ajudasse (Barack Hussein Obama II), em um país que possui uma sociedade racialista e belicista como a americana, ele chegou lá. Em parte pelo seu potencial intelectual e a sua capacidade de sedução. Mas, não podemos negar o sentimento de insatisfação da maioria do povo norte-americano com a política republicana atual. Até a sua chegada ao Senado de IIIinois, a historia política de Obama foi marcada por “trapalhadas” republicanas e democratas: em 2004, concorreu nas primarias com o outro candidato democrata Blair Hull, esse caiu fora após escândalo de violência domestica que o envolvia. Após ser escolhido pelos democratas concorreu com o então candidato republicano Jack Ryan, durante a campanha Ryan foi implicado por causa de um escândalo sexual (foi acusado de levar a sua mulher a um clube de sexo), aí já viu, caiu fora também, Obama torna-se Senador. De 2004 para 2008 foi um pulo. Não foi a cor do presidente que deflagrou o processo de escolha e sim a fragilidade do país frente a outras nações emergentes (entenda-se China), e o fortalecimento econômico e geopolítico da Europa, entre outras questões não raciais. Sem falar nos vinte dias anteriores ao pleito, quando explodiu a crise econômica norte americana enterrando de vez a candidatura do Jonh McCain, levando Bush a sair da Casa Branca (e da Historia), por onde entrou. Pela porta dos fundos.

Para alem da cor - O filosofo Foucault em A Vontade de Saber. Diz: “Onde existe poder, existe resistência”. As questões a serem debatidas e trabalhadas pelo Obama não somente em relação a política interna de seu pais, mas ,principalmente externa, é que vão talvez aproxima-lo do patamar de um Mandela ( Esse, o maior estadista vivo da História) Questões referente a: aliados estratégicos, imposição econômica, meio ambiente e protecionismo, vão dominar sua agenda. A tirar pela parte de sua recém anunciada equipe de governo, parece que não ficara muito longe das velhas praticas imperialistas, o que demonstra que independe da cor da pele a mudança a ser feita, e sim, o exercício do poder por parte de quem o possui. Esse sim, o ponto a ser pensado e debatido muito antes de deseja-lo, seja por negros, brancos ou mulatos. Mas, contudo, continuo a comemorar a eleição do Obama e pretendo faze-lo por muito mais tempo, em parte só depende dele, afinal de contas, como o Luther King eu também tenho um sonho.


Hanka Nogueira


Luz e Força